No dia 3 de junho de 1917, a cidade de Manaus amanheceu com uma notícia alarmante estampada na capa do Jornal do Commercio: “Guerra aos gafanhotos!”. O título não era exagerado, pois a capital amazonense estava enfrentando uma das piores pragas de sua história. Milhares de gafanhotos invadiram a cidade, devastando plantações, jardins e até comprometendo o funcionamento dos bondes elétricos. A população, desesperada, buscava formas de conter a destruição provocada pelos insetos.
O Impacto da Praga na Cidade
A invasão de gafanhotos não afetou apenas a zona urbana de Manaus, mas também suas áreas suburbanas e colônias agrícolas, como Campo Salles, João Alfredo e Oliveira Machado. Os insetos se espalharam rapidamente, consumindo folhas, flores e frutos, comprometendo a subsistência da população que dependia das lavouras para alimentação e comércio.
Além dos prejuízos na agricultura, os gafanhotos também afetaram o transporte público. Os trilhos dos bondes ficaram cobertos por uma camada viscosa, formada pelos insetos esmagados, o que causava descarrilamentos e acidentes. A situação foi se agravando, e o governo precisou agir rapidamente para evitar um colapso na cidade.
Vendedores de Gafanhotos na sede da Secretaria Estadual vendendo / Foto : Divulgação
A Resposta do Governo
Diante da calamidade, o então governador do Amazonas, Pedro Alcântara Bacellar, tomou uma medida drástica: ofereceu mil réis por quilo de gafanhotos capturados. O anúncio atraiu uma grande quantidade de pessoas que passaram a coletar os insetos para receber a recompensa. A estratégia parecia funcionar, pois toneladas de gafanhotos eram entregues diariamente na Secretaria do Estado, localizada na Rua Demétrio Ribeiro.
Os insetos recolhidos eram levados a fornos de incineração, garantindo que a praga não continuasse se multiplicando. Em poucos dias, foram queimados quase três mil quilos de gafanhotos, um número impressionante para a época.
Governador Pedro de Alcantara Bacellar
O Aproveitamento da Situação pela População
A oferta de pagamento pelos gafanhotos transformou o problema em uma oportunidade financeira para muitas famílias. Algumas pessoas dedicaram-se integralmente à coleta dos insetos, conseguindo uma renda significativa. Diante disso, o governo decidiu reduzir o valor pago por quilo de gafanhotos, passando de cinco para três mil réis, pois os gastos estavam aumentando rapidamente.
Apesar da intensa mobilização, a praga persistia. Os gafanhotos continuavam a se reproduzir, e a população começou a organizar novenas pedindo que a infestação chegasse ao fim. A esperança veio com a chegada das chuvas de novembro. O solo encharcado impediu a eclosão de novas larvas, fazendo com que a praga desaparecesse gradativamente.
Vendedores de Gafanhotos na sede da Secretaria Estadual vendendo / Foto : Divulgação
Uma Crise Inusitada na História de Manaus
O episódio da invasão dos gafanhotos ficou marcado como uma das crises mais inusitadas da história de Manaus. Foi um momento em que o governo e a população precisaram trabalhar juntos para conter um problema que ameaçava a economia e o cotidiano da cidade.
Curiosamente, essa estratégia de pagar para que a população eliminasse pragas não era uma novidade. Em 1904, no Rio de Janeiro, o governo havia adotado uma medida semelhante para combater a proliferação de ratos, pagando por cada animal capturado. A prática, apesar de controversa, mostrou-se eficaz na época.
Hoje, olhando para o passado, a “Guerra aos Gafanhotos” de 1917 é um exemplo de como crises ambientais podem impactar cidades de maneiras inesperadas. Esse episódio histórico mostra a resiliência dos manauaras e a criatividade das soluções adotadas em tempos difíceis. Afinal, a história da Amazônia está repleta de desafios que moldaram a identidade do povo que habita essa região rica e cheia de surpresas.
Sou o idealizador do No Amazonas é Assim e um apaixonado pela nossa terra. Gravo vídeos sobre cultura, comunicação digital, turismo e empreendedorismo além de políticas públicas.