Publicado
8 meses atrásno
Em 5 de fevereiro de 1952, a tranquila Manaus foi abalada por um crime que se tornaria o mais notório de sua história. O Caso Delmo, narrado detalhadamente pelo escritor Durango Duarte, revela uma série de eventos que chocaram a sociedade amazonense dos anos 1950, trazendo à tona questões de justiça, vingança e moralidade.
Delmo Campelo Pereira, um jovem de boa família, foi acusado de uma série de crimes violentos ocorridos na madrugada de 30 para 31 de janeiro de 1952. Ele confessou ter assaltado a Serraria Pereira, pertencente a seu pai, agredido o vigia Antônio Firmino da Silva e assassinado o taxista José Honório Alves da Costa. A princípio, Delmo assumiu a total responsabilidade pelos crimes, mas suas confissões eram inconsistentes. Em certos momentos, ele insinuava ter cúmplices, enquanto em outros afirmava ser o único envolvido.
A polícia, desesperada para esclarecer o caso, submeteu Delmo ao “soro da verdade” na esperança de obter uma confissão mais coerente. No entanto, suas declarações continuaram a divergir, criando um clima de incerteza e suspeita.
A contradição nos depoimentos de Delmo levou a uma crescente frustração entre os policiais e a população. Em 5 de fevereiro, Delmo foi sequestrado por um grupo de taxistas enfurecidos, que buscavam forçá-lo a revelar os nomes de seus possíveis cúmplices. No entanto, sob tortura, Delmo permaneceu ambíguo. Incapazes de obter respostas concretas, os taxistas o espancaram brutalmente até a morte.
A violência de sua morte e a indignação pública transformaram Delmo, outrora visto como um assassino cruel, em uma figura trágica e vítima de um sistema falho. Seu funeral foi um evento que mobilizou a cidade, refletindo a profunda comoção que tomou conta de Manaus.
A brutalidade do assassinato de Delmo despertou uma reação fervorosa da sociedade civil, especialmente entre os estudantes. Entidades estudantis arrecadaram fundos para contratar o renomado advogado Celso Nascimento, do Rio de Janeiro, para auxiliar na acusação dos culpados. A pressão popular levou o governador Álvaro Maia a reorganizar a cúpula da Central de Polícia, que foi criticada por sua ineficiência e possível conivência no sequestro de Delmo.
Inúmeros taxistas foram presos e investigados. O processo envolveu mais de 60 suspeitos, com mais de 40 sendo inicialmente detidos na Penitenciária Central. A imprensa local, embora muitas vezes parcial, manteve o público informado e engajado, o que exacerbava a tensão social.
O julgamento dos acusados foi um evento complexo e demorado. Entre as dezenas de suspeitos, 28 foram levados ao banco dos réus. Destes, muitos possuíam apelidos notórios, como Antônio Vicente de Araújo (Puxa-Faca), Aurino do Espírito Santo Silva (Santo-Pobre), e Francisco Ribeiro dos Santos (Toba-de-Vaca). A defesa dos taxistas foi liderada por advogados renomados, enquanto a promotoria, auxiliada por Celso Nascimento, trabalhou arduamente para garantir a condenação dos culpados.
Os julgamentos ocorreram no Tribunal do Júri do então Palácio da Justiça Clóvis Bevilácqua. Durante os primeiros julgamentos, a defesa parecia ter vantagem, com nove absolvições contra sete condenações. No entanto, a chegada de Celso Nascimento mudou o curso dos eventos, resultando em um total de 19 condenações contra nove absolvições.
Entre os condenados, destacavam-se aqueles considerados “os cabeças” da chacina, como “Pirulito”, “Carioca”, “Santo-Pobre” e “Luiz-Mal-de-Vida”. A atuação da promotoria, com o auxílio de Celso Nascimento, foi crucial para este resultado.
O Caso Delmo não foi apenas um marco na crônica policial de Manaus, mas também um catalisador para mudanças na justiça e na sociedade amazonense. Ele expôs as fragilidades do sistema de segurança pública e a vulnerabilidade dos acusados a julgamentos sumários por parte da população. Além disso, destacou a importância do devido processo legal e da defesa dos direitos humanos, mesmo para aqueles acusados de crimes graves.
Os eventos em torno do Caso Delmo e a subsequente reação social e judicial continuam a ser estudados como exemplo de um período em que a busca por justiça extrapolou os limites da legalidade e da moralidade. A história deste caso permanece viva nas memórias de Manaus, um lembrete sombrio das consequências da violência e da justiça pelas próprias mãos.
O Caso Delmo é um episódio emblemático da história de Manaus, representando um momento em que a linha entre vítima e algoz se tornou nebulosa. Durango Duarte, ao compilar as manchetes e reportagens da época, ofereceu um retrato vívido dos acontecimentos, permitindo aos leitores mergulharem na atmosfera tensa e inquietante daqueles dias. O caso serve como um alerta eterno sobre os perigos do julgamento precipitado e da justiça sumária, lembrando-nos da necessidade de processos justos e humanos em qualquer circunstância.
Sou o idealizador do No Amazonas é Assim e um apaixonado pela nossa terra. Gravo vídeos sobre cultura, comunicação digital, turismo e empreendedorismo além de políticas públicas.
Julgamento dos Assassinos de Bruno Pereira e Dom Phillips: Defesa Tenta Evitar Júri Popular
Vídeo +18 : Homem m0rr3 ao ser 3sf@que@do na Av. Getúlio Vargas no Centro de Manaus
Além da Crueldade: Lições e Alertas do Caso Mangue 937
Como ficaram os acusados do sanguinário caso Mangue 937
Após ser amordaçado e ticado, corpo foi jogado atrás da Maternidade da Zona Leste de Manaus
Caso Belota : História real de um triplo assassinato friamente planejado em Manaus