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5 anos atrásno
Em um vídeo que tem viralizado nos grupos de WhatsApp , um homem alega que passar álcool em gel nas mãos não é eficaz na prevenção de infecções por vírus e bactérias. Pior: ele favoreceria a transmissão de doenças como o Coronavírus (Covid-19).
O homem que aparece no vídeo se apresenta como Jorge Gustavo, que se diz químico autodidata desde 1995, ele afirma que o álcool em gel, além de ser ineficaz, pode gerar mais bactérias. Porém que todas as afirmações feitas pelo falso químico não são verdadeiras, informa Álvaro José dos Santos Neto, farmacêutico doutor em Química Analítica e professor do Instituto de Química de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP). “O que ele fala é simplesmente uma sucessão de besteiras, recheada por diversos erros técnicos e conceituais”, resume o doutor em Química Analítica.
A profissão de químico é regulamentada bem como a de engenheiros, enfermeiros, psicólogos e tantas outras, que exige formação e cadastro em uma entidade profissional, que estabelece regras para uma atuação ética. E com o intuito de transmitir informações de forma correta e responsável, o Portal No Amazonas é Assim conversou com o farmáceutico formado pela Universidade do Federal do Amazonas, Marcelo Serafim, sobre as declarações que o homem faz no vídeo.
De acordo com Marcelo, o vídeo é irresponsável, um verdadeiro crime justo quando as pessoas precisam se conscientizar da gravidade da pandemia que estamos vivendo.”Esse homem tinha que ser preso, esse cara, desculpa a expressão, é um canalha, esse cara presta um desserviço a humanidade. Esse vídeo já circula aí a umas três semanas, é irresponsável, esse cara tinha que ser identificado e preso e algemado, declarou Serafim.
Adriana Pimentel de Almeida Carvalho, coordenadora do curso de Química da Universidade , repudia veementemente o vídeo. “Isso é muito grave. Nós estudamos, pesquisamos muito, publicamos tantos artigos e de repente uma pessoa vem se dizendo autodidata e coloca a população quase que em pânico. Toda uma recomendação científica de órgãos que são muito respeitados – isso a nível mundial- e ele fala que tudo isso não vale de nada”, relatou a professora.
De acordo com Adriana, o discurso apresentado no vídeo traz muitas falhas, como por exemplo, quando se fala da composição do álcool. “Começa ali uma fragilidade da fala, que para nós que somos da área e entendemos o que ele fala, ficamos preocupados. Ele comenta que o álcool 70 tem 70% de água e não de álcool. Isso é errado! Temos várias monografias que mostram que, em toda indústria farmacêutica e industria química, a fabricação do álcool em gel é justamente o contrário: Indicam que ele tem 70% de álcool etílico e 10% de água na composição”, explicou.
O falso químico diz que o álcool pode ser substituído pelo vinagre, o que caracteriza mais um erro grave. “Outro erro químico que ele diz. O vinagre é um ácido acético que, mesmo fraco, pode causar lesões. O vinagre comercial é uma solução de ácido acético numa composição de 4%, mas isso é pouco para dar um poder de assepsia à esse produto”, disse a professora.
A disseminação do vídeo levou o Conselho Federal de Química (CFQ) a liberar uma nota esclarecendo que o álcool em gel 70% é, sim, eficiente para se proteger de vírus e bactérias, assim como lavar a mão com água e sabão.
Confira a nota na integra:
NOTA OFICIAL – PROPRIEDADES DO ÁLCOOL GEL
Diante da difusão de um vídeo com informações inexatas a respeito do emprego de “álcool gel” na higiene das mãos como prevenção ao contágio por coronavirus, o presidente do Conselho Federal de Química (CFQ), José de Ribamar Oliveira Filho, vem a público esclarecer que:
a) O álcool etílico (etanol) é um eficiente desinfetante de superfícies/objetos e antisséptico de pele. Para este propósito, o grau alcoólico recomendado é 70% v/v, condição que propicia a desnaturação de proteínas e de estruturas lipídicas da membrana celular, e a consequente destruição do microrganismo (lise celular).
b) O etanol age rapidamente sobre bactérias vegetativas (inclusive microbactérias), vírus e fungos, sendo a higienização equivalente e até superior à lavagem de mãos com sabão comum ou alguns tipos de antissépticos degermantes (BRASIL – MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2010).
c) A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), através da RDC 42 de 2010, tornou obrigatória a disponibilização de preparação alcoólica para fricção antisséptica das mãos, pelos serviços de saúde do país nessa concentração de 70%, podendo inclusive ser uma preparação em gel.
d) Acerca do coronavírus (COVID-19), foi publicada em 27/02/2020, pela Organização Mundial de Saúde (OMS), uma orientação provisória, dizendo que a utilização de álcool gel é uma eficaz medida preventiva e mitigatória ao COVID-19, tanto nos setores da saúde, quanto para a comunidade em geral.
Cabe salientar que o CFQ não reconhece como válida a autodenominação de “químico autodidata” ou a de pessoas que atuem nas atividades da Química sem o devido registro profissional.
A falta do registro configura infração tipificada no artigo 47 da Lei de Contravenções Penais (3.688/41) como exercício ilegal da profissão – sem prejuízo de enquadramento em outras normas legais, como o previsto no artigo 332 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a lei 5.452/43, no que diz que:
“Quem, mediante anúncios, placas, cartões comerciais ou outros meios capazes de ser identificados, aquele que “se propuser ao exercício da química, em qualquer dos seus ramos, sem que esteja devidamente registrado, fica sujeito às penalidades aplicáveis ao exercício ilegal da profissão”.
E da Lei 2.800/56, a Lei Mater dos Químicos, no que refere seu artigo 25:
“O profissional da química, para o exercício de sua profissão, é obrigado ao registro no Conselho Regional de Química a cuja jurisdição estiver sujeito (…).”
Constatadas irregularidades no que tange à qualificação e ao registro profissional, o Sistema CFQ/CRQs oferecerá denúncia cabível junto ao Ministério Público, observando a devida proteção à população.
À sociedade, o Sistema CFQ/CRQs orienta pela busca de informações válidas e de fontes confiáveis, com especial atenção àquelas oriundas das autoridades de Saúde. Tão importante quanto proteger a população no que diz respeito ao contágio do novo vírus é evitar o alarmismo e a viralização de conteúdos sem a devida verificação.
Segundo conta o presidente do Conselho Regional de Química do Rio de Janeiro (RJ), Rafael Barreto Almada, o próprio fato de o autor se denominar um “químico autodidata” levanta suspeitas. “O autor está sendo denunciado ao Ministério Público, uma vez que se intitula químico sem o ser de fato. Ele não tem nem formação nem registro em nenhum órgão competente”, comenta Rafael.
Sou o idealizador do No Amazonas é Assim e um apaixonado pela nossa terra. Gravo vídeos sobre cultura, comunicação digital, turismo e empreendedorismo além de políticas públicas.